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Archive for the ‘O Meu Filme’ Category

OUT OF AFRICA (título original)
ENTRE DOIS AMORES (título no Brasil)
ÁFRICA MINHA (título em Portugal)

Quantas vezes já peguei no DVD “AFRICA MINHA” e obriguei o leitor a mostrá-lo no ecrã lá de casa ? E é um momento em que recordo o grande espanto de sentimentos que foi, nos meus olhos e na minha alma, a sua primeira exibição – estou agora a referir-me ao cinema – na pantalha do S. Jorge.

No fundo estou a saudar uma quase intimidade com o livro de Karen Blixen e com o filme do realizador Sydney Pollack.

Porquê intimidade ?

Porque também já caminhei entre os rugidos do leão da anhara ?

Porque o meu jeep de outros tempos também voou diante de uma manada de elefantes ?

Porque as zebras lá do Quénia vestem o mesmo casaco riscado de outras que conheci nas terras da Lunda ?

Porque, também na região do Bembe, nasce o café num corrupio de flores brancas – até que o campo se torna vermelho com o amadurecer das bagas ?

Porque os Kikuyu desenham sorrisos tão leves como os quicongos ou os bailundos ?

Porquê intimidade ?

E enquanto tanto me pergunto, sigo na avioneta do filme (apenas essa) os caminhos do céu, de florestas e savanas. E ainda está nos meus ouvidos todo o eco das marimbas apesar das sinfonias de Mozart, as que se ouviam na casa de Karen Blixen.
Carlos Brandão Lucas

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A escolha do par “Mancha humana” para este exercício reflecte muito mais o gosto que senti ao ler o livro do que um juízo positivo sobre o filme a que ele deu origem. Isto é, gostei muito, mas mesmo muito do livro e, tal como me acontece quase sempre em circunstâncias semelhantes, não apreciei particularmente o filme embora também não possa dizer à
la lusitana que haja sido “uma grande desilusão”.
Estou acompanhado nesta apreciação pelo autor que já mais do que uma vez referiu considerar Human Stain uma das suas melhores obras, em contraste com a classificação de “fraquinho” que atribuiu ao filme. Philip Roth costuma dizer, aliás, que depois do “Goodbye, Columbus” nenhum dos outros filmes feitos a partir dos seus livros atingiu um nível aceitável. Existe assim uma aparente consonância entre escritor e leitor entusiasmado/espectador decepcionado. Não tenho conhecimentos suficientes para discutir as razões desta frequente dissociação para além das habituais generalidades: nível das expectativas, diferenças artísticas, factor surpresa, variabilidade narrativa, “tempos” diferentes, …
Gostei (e continuo a gostar) da maioria dos livros de Philip Roth que li embora confesse que me irrita sempre um bocado aquela certeza de que seja qual for a história ela andará à volta de um jovem judeu nascido na Newark dos anos pós-depressão e/ou do adulto que lhe sucedeu e que Nathan Zuckerman epitomiza desta vez como o narrador-amigo-do-protagonista. Mais recentemente, a tonalidade autobiográfica do jovem judeu heterodoxo entretanto envelhecido tem-nos arrastado com uma violência quase-machista para os problemas da terceira idade que o afligem.
As contrário dos outros livros a Mancha Humana passa-se no presente, num dos períodos mais marcantes da minha geração – a América do fim dos anos noventa – e sem deixar de ser povoado pelos fantasmas habituais do autor, dá vários passos em frente. De entre eles salientaria os que mais influenciaram a minha escolha: uma narrativa exemplar dos EUA e das suas gentes, a raça e o racismo, o politicamente correcto, e a organização do poder, seja académico ou outro. Alguns deles afloram no filme, infelizmente de forma bastante menos conseguida do que no livro.
Porto, 19 de Novembro de 2009
Manuel Sobrinho Simões

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Gran Torino

Clint Eastwood volta, aos 79 anos e depois de uma paragem de quatro sobre o Billion Dollar Baby, a realizar, produzir e interpretar um filme que, do meu ponto de vista pessoal, é uma das suas melhores obras. A coadjuvá-lo tem dois dos seus filhos Scot e Kyle. A história é duma imensa simplicidade e talvez resida aí a sua grande força. Walt Kovalsky é um veterano da guerra da Coreia, de origem polaca, aposentado da Ford, que perdeu recentemente a mulher. Vive sozinho com a sua cadela Daisy – uma Labrador Retriever -, tem mau feitio e os filhos praticamente ignoram-no, porque desejam interná-lo num lar para idosos.
Duro e de difícil relacionamento, vive num bairro onde antes havia uma classe média de trabalhadores brancos, mas que agora é dominado por asiáticos pobres e gangues violentos.
É neste contexto que Walt vai aprender aquilo que a vida, antes, parece não lhe ter ensinado: que todos somos seres humanos que precisamos uns dos outros, independentemente da raça, do credo ou da forma de vida.
É também um filme sobre a solidão, a honra, a fidelidade aos valores em que acreditamos e às marcas que a guerra deixa naqueles que para ela vão. E é, não haja qualquer dúvida, um hino ao amor do próximo!
Helena Sacadura Cabral
Lisboa, 24 de Setembro de 2009

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“Uma mente brilhante”, de Ron Howard
Por Simone de Oliveira

“Uma Mente Brilhante” é um filme de desafios, como, de desafios foi a vida de John Nash.

A linha que separa o louco do génio é muito ténue, o que nos leva a reflectir.

O complicado universo dos números é aqui desmontado. Ficamos a perceber a sua frieza e a sua importância, provando-se mais uma vez que são uma arma, uma arma que apaixona muita gente.

Este filme dá-nos a conhecer uma personalidade, um prémio Nobel, e mostra-nos ainda a vida difícil de um génio.

Uma história verídica brilhantemente representada por Russell Crowe.

Simone de Oliveira

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“O Processo”, de Orson Welles (1962)
Por Valter Hugo Mãe

Nenhum autor me marcou mais do que Franz Kafka. Nenhum outro, como ele, me convenceria da maravilha da escrita feita de ritmo e meticuloso cuidado com a linguagem. Com Kafka não passei por nenhuma página aborrecida e o cansaço era só possível pela gula com que o lia, atravessando as horas até que o corpo divergisse, muito malcriado, daquilo que era o ensejo da minha cabeça. Com a leitura de textos como «A Metamorfose», «O Castelo», «O Covil» ou «O Processo», eu encontrei no universo de Kafka uma constante que problematiza o real mas que nos impele para um certo fantástico empolgante: em todos os livros deste autor está em causa a subjugação do indivíduo a um poder que não dá a cara, assistimos a uma manipulação bizarra do indivíduo que se vê enredado numa teia de acontecimentos que ultrapassam largamente o seu entendimento e que se resolverão por razões exteriores à sua vontade ou empenho. O que Kafka uma e outra vez questiona é o poder, esse ser que se anima por uma qualquer duvidosa legitimação, uma legitimação que se perde no tempo e na burocracia, e que persegue uma dada personagem colocando-a em crise em relação a tudo quanto tinha como estabelecido. Por norma, encontramos o cidadão comum que, sem perceber porquê, e para satisfação de uma necessidade que o sistema sinistramente desenvolve, é colocado em xeque e precisa, por isso, de se repensar e defender.
Exactamente o sinistro, como ambiência de um secretismo grande, ou sentimento de uma fundamental incompletude, é a tonalidade geral do trabalho de Kafka, e leva quase sempre à construção de uma narrativa com suspense que convence o leitor mais incauto de que tudo se trata de hipóteses fantasiosas do mundo, mas também avisa os melhores leitores do perigo da sociedade quando já não obedece a qualquer princípio de efectividade e o sistema se desliga dos preceitos axiológicos e se perde em retóricas sobre si mesmo e numera o indivíduo e o dá como estatística e mais nada. Todos os sistemas deviam ser legitimados pelo tamanho do homem, deviam ter o tamanho do homem mas, ao invés disso, alguns parecem agigantar-se criando uma mesura que já é relativa à máquina, às necessidades específicas da máquina, como um ser vivo novo e cada vez mais autónomo, no qual o homem surge como combustível e nunca como objectivo.
A questão de Kafka é visionária e perdura mais e mais actual, anunciando, de algum modo, ao futuro, aquilo de que não se vai livrar. Essa capacidade de criar lucidez a partir da literatura é o milagre mais absoluto da escrita e da criatividade de um autor; essa glória de poder recriar a realidade num livro que explique tanto do até ali foi inexplicável, juntando num mesmo discurso o isco da trama e o esplendor do pensamento revelador acerca de todos nós. Mais ainda porque Kafka o faz com recurso a uma escrita limpa, inequívoca – os equívocos, ou sua alusão, ficam todos para o lado semântico do texto – que pretende posicionar-se como uma técnica quase exacta, um discurso como profundamente técnico e consciente, para ser capaz de manter o foco sobre o delicado assunto de que trata. A escrita de Kafka é escorreita e ritmada pela descrição sem rodeios de cada pormenor, uma descrição pelo essencial da acção, sem se perder no embelezamento ou na deambulação por moralismos bacocos. O que lemos em Kafka diria ser um discurso sem atrito, feito para a comunicação nítida do que, por sua vez, é o mais insondável da sociedade, do que, por sua vez, é o atrito mais predador da sociedade.
Quando Orson Welles pega num texto de Kafka – e Welles é perfeito para Kafka – fá-lo desde logo confiante de que toma em mãos o melhor possível e termina inclusive o filme para se convencer, para sempre, que este seria a sua obra-prima mais absoluta. Quando Welles toma o texto em suas mãos leva-o a criar outros sentidos à luz do que seria a realidade universal no início dos anos 60, já depois de duas guerras que trariam ao mundo o fim de uma ingenuidade que, magnificamente, nunca fez parte de Kafka. O livro terá sido escrito em 1919 (publicado depois, por decisão de Max Brod, em 1925) e o filme é de 1962. Neste tempo eu diria que o trabalho de Kafka ganhou evidência, como se fosse calmamente assistindo à confirmação contínua das suas percepções incómodas sobre a alma humana. Talvez nem Kafka tivesse entendido o quanto entendeu o futuro, e talvez por isso lhe tenha dado a perigosa loucura de pedir ao amigo que destruísse quanto havia escrito e se mantinha ainda inédito. Max Brod, que não é um génio, foi genial pela sorte de ter contrariado a vontade do outro assim oferecendo ao mundo uma das obras mais fascinantes de sempre.
E Welles toma decisões sobre a trama para posicionar o seu filme de um modo ligeiramente mais definido do que o livro que lhe deu origem. Decisões que vêm fazer de Joseph K. um indivíduo acossado que acaba condenado de um modo mais desprezível do que Kafka escolheu, acentuando sobretudo a covardia dos homens que o executam, a covardia dos grandes erros do homem que, pelas duas guerras passadas, mostrou como se podia manter as mãos cinicamente limpas eliminando o adversário.
Este livro e este filme não podem deixar de estar nas preocupações de quem espera da sociedade uma responsabilidade protectora; são fundamentais para nos enriquecermos enquanto cidadãos, metidos debaixo de Estados de Direito, tantas vezes sem noção alguma do que justifica a aceitação generalizada da existência de um Estado e do que justifica, importantemente, a imposição a todas as pessoas de um sistema normativo. E é bom, para que a conversa se sintonize, que recordemos desde logo que justificar é denotar o aspecto justo de algo, fazendo com que a pergunta, nas suas variações, seja: o que torna justa a existência de um Estado? O que é um Estado justo? O Direito é justo em que medida? E, o que é a Justiça?
valter hugo mãe

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“O dia mais longo”, de Ken Annakin, Andrew Marton, Bernhard Wicki e Darryl F. Zanuck (1962)
Por Helder Pacheco

1 – O ACONTECIMENTO

– O Dia D é o pano de fundo de um livro e de um filme.
– Em 6 de Junho de 1944 a Operação Over Lord abriria uma 2ª Frente na Guerra na Europa, em que 5.000 navios desembarcaram 200.000 soldados aliados.
– Apoio: 880 aviões lançaram 13.000 soldados, tendo ainda 9.000 aviões de bombardeamento.
– Foi o maior desembarque da História e decorreu em 5 praias: Utah/Omaha (Americanos), Gold/Sword (Britânicos) e Juno (Canadianos).
– A Invasão foi precedida de mensagem enviada à Resistência Francesa com versos do poema de Paul Verlaine “Chanson D’Automne: «Les Sanglots Longs des Violons de L’Automne, Blessent mon cour d’une languer monotone».
– Nas primeiras 24 horas decisivas calcula-se que as forças aliadas perderam entre 10 e 12.000 homens.
– Os alemães terão perdido 9.000 homens. Mas o Marechal Rommel, com alguma ironia e desencanto, em fins de Junho diria que as perdas seriam 28 Generais, 354 Oficiais e 250.000 homens. Ou seja: o exército que defendia a chamada Muralha do Atlântico considerada inexpugnável.
– Um mês depois do desembarque os Aliados tinham no terreno 550.000 homens.
– Seria o princípio do fim do 3º Reich, destinado a durar 1.000 anos!
– Em Maio de 1945 os Aliados tomariam Berlim.

2 – O LIVRO

– O Livro “O Dia mais Longo” foi publicado em 1959, 15 anos depois do “Dia D”.
– O título foi extraído de uma frase de Rommel que, em 22 de Abril de 44, diria ao seu Ajudante de Campo: «Acredite-me, Lang, as primeiras 24 horas da invasão serão decisivas… Dela dependerá o destino da Alemanha… Tanto para os Aliados como para nós esse será o dia mais longo».
– O autor, Cornelius Ryan, cobriu o conflito como correspondente de guerra, até à queda de Berlim, a que assistiu.
– Para escrever o livro, além da própria experiência na frente da batalha, reuniu enorme quantidade de informação, através de uma investigação profunda, contactos directos com intervenientes, consulta de arquivos e recolha de documentos.
– Realizou verdadeiro trabalho de historiador, utilizando um olhar de jornalista e repórter de guerra.
– Cornelius Ryan entrevistou 700 participantes no conflito e todos os factos que descreve foram corroborados cruzando os depoimentos de 3 testemunhas dos acontecimentos.
– O livro constituiu enorme sucesso mundial (4 milhões de exemplares vendidos) e foi traduzido em 26 idiomas.
– Outro livro de Cornelius Ryan “A Bridge Too Far” deu origem a outro notável filme.

3 – O FILME

– Com 3 horas de exibição era o maior filme produzido pelo cinema norte-americano e, ainda hoje, o maior clássico sobre a II Guerra Mundial. Rodado em 1962 dezoito anos após os acontecimentos, ainda estava próximos deles.
– É verdadeiramente uma crónica da invasão, constituída por pequenos episódios que se sucedem formando um puzzle que, lentamente, vai encaixando à medida que as Forças Aliadas progridem em França.
– Alguns autores consideram-no um filme épico, um docudrama revelando, simultânea e objectivamente, pontos de vista e comportamentos Americanos, Alemães, Franceses e Ingleses – cada um falando a sua língua (o que não era, nem é, frequente em cinema).
– A narrativa é realista, despojada, quase de um repórter nos locais e há quem critique o filme por apresentar histórias a mais. A fidelidade à narração do livro exige-o, num estilo de crónica que vamos vendo como quem lê a realidade num drama a que o preto e branco (o maior antes de “A Lista de Shindler”) dá grande intensidade.
– Os efeitos dramáticos são admiráveis de simplicidade: o poema de Verlaine / as pancadas iniciais da 5ª Sinfonia – “do Destino” – com que a BBC iniciava as emissões / o capacete do soldado morto tombado – como acontecia, de facto – na praia.
– Para dar maior veracidade aos próprios géneros da linguagem cinematográfica utilizada, assinam a realização 5 autores: Ken Annakin (exteriores ingleses) Andrew Morton (exteriores americanos) e Bernhard Wicki (famoso realizador germânico, as cenas alemãs).
– Filmado com rigor histórico sobre os dois lados do conflito, é patente no filme (e nos factos) a desorientação, contradições, conflitos de competências e até de incompetência dos comandos Alemães, enquanto do lado Aliado as personagens reflectem a determinação, a coesão e a extraordinária humanidade dos figurantes, desde ao altos comandos aos operacionais.
– À distância de quase 50 anos este filme permanece como um sensível, tocante e completo fresco sobre a coragem e a dignidade dos combatentes que vieram libertar a Europa de um dos maiores pesadelos da sua História.
– Depois de vermos “O Resgate do Soldado Ryan”, “A Linha Invisível” (obra magnífica de Terence Malik) e, ultimamente, “A Bandeira dos Nossos Pais” e “Cartas de Iwo Jima”, de Clint Easttwood, espectaculares e providos de meios tecnológicos absolutamente insuspeitados em 1962, este “Dia Mais Longo” surge-nos quase como um documento de arquivo. Dele está ausente a espectacularidade dos efeitos sonoros e visuais. No entanto, as imagens habituais dos livros, revistas e documentários sobre a II Guerra Mundial são assim mesmo. Nele não há ficção nem artifício mas, simplesmente, a realidade e talvez seja esse o seu mérito, a sua grande lição. Nele não estamos de fora, contemplando a tragédia, estamos dentro dele porque tudo é verosímil: a angústia da espera, o nervosismo das tropas, a expectativa do desembarque eminente (onde?). Os medos e as pequenas coisas que antecedem, para uns a morte, para outros a glória anónima, são admiravelmente retratados.

4 – RAZÕES DA ESCOLHA

– Para mim “O Dia Mais Longo” é o regresso à infância, as vivências da II Guerra vistas do Porto, ouvindo a rádio clandestinamente, todas as noites, vendo as fotografias de revistas e jornais – sobretudo as de propaganda Aliada, pressentindo angústias sobre o futuro e as terríveis dificuldades do dia a dia (o racionamento, as bichas, a repressão política).
– Quando os Aliados desembarcaram, meu pai republicano e – tal como a maioria da população da cidade – admirador dos Aliados, viveu um momento eufórico.
– Acompanhou-se, depois, intensamente, o avanço Aliado e, quando a Guerra acabou, a Baixa encheu-se de multidões com as bandeiras Aliadas, enterrou-se o Hitler e a Polícia reprimiu duramente as manifestações que duraram dois ou três dias.
– Salazar decretou três dias de luto nacional e muita gente estava convencida de que a Ditadura cairia com a derrota do Nazi-Fascismo.
– Puro engano, por cá ficou tudo na mesma.
– Um dos grandes desejos de meu pai era visitar os lugares míticos do desembarque: as praias da Normandia. Não conseguiu concretizar esse intento.
– Há dois anos, em memória dele e da minha infância, aluguei um carro, em Paris, e fui percorrer todos aqueles sítios ligados ao heroísmo de milhares de jovens que ali desembarcaram para que o futuro da Humanidade fosse melhor e mais justo. Em liberdade. Não por mim, mas pelos meus filhos e os filhos deles espero que tal sacrifício tenha valido a pena.
Helder Pacheco

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“A Palavra”, de Carl Dreyer (1955)
Por Guilherme d’Oliveira Martins

“A Palavra” de Carl Dreyer (1955) é uma das grandes referências da história do cinema.
Tendo como tema a fé e o milagre, sob a forte influência do pensamento do filósofo dinamarquês Sören Kierkegaard, o filme apresenta uma forte tensão existencial que lhe permite não só representar o tempo de transição em que foi concebido e produzido mas também assumir uma dimensão intemporal que hoje lhe concede uma aura muito especial.
O velho Morten Borgen e os filhos Mikkel e André começam por procurar Johannes o irmão mais novo que na sua loucura julga ser uma encarnação de Jesus Cristo. Inger mulher de Mikkel está grávida, tenta consolá-los. Entretanto as coisas precipitam-se, acontece o parto prematuro do filho de Inger, a que se segue a morte do recém-nascido. Isto enquanto Borgen discute com Peter a hipótese de casamento da filha deste com Johannes. Mas Inger não resiste e morre, como Johannes profetizara. Quando se prepara o funeral da jovem mãe, Johannes aparece, com uma surpreendente lucidez e acusa Mikkel de falta de fé por nada ter feito para fazer voltar à vida a mulher cuja alma, mas também o corpo, amava … E é a partir deste momento que o milagre ocorre, com o surpreendente regresso à vida de Inger, fazendo reviver o episódio de Lázaro.
Trata-se de uma adaptação da peça teatral homónima de Kaj Munk (1898-1944), pastor e dramaturgo, que Carl Dreyer viu em cena em 1932 – e que causou no cineasta uma forte impressão, obrigando-o a uma relação inteiramente nova com a espiritualidade.
“A paixão de Joana d’Arc” (1928), “O Vampiro” (1932), “Dias de Ira” (1943) e “Gertrud” (1964) são obras marcantes de Dreyer que permitem seguir um percurso de exigência ética, estética e religiosa em que o cinema e o pensamento se interinfluenciam. É a força da dignidade humana o grande tema perene de Dreyer.
Guilherme d’ Oliveira Martins

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O Padrinho, de Francis Ford Coppola
Por Manuel Carvalho da Silva

Respondendo ao honroso convite que me foi formulado pelo Director da Casa Museu de Camilo para participar no ciclo de cinema “Um Livro, um Filme”, aí estarei em 31 de Outubro.
A minha escolha recaiu em “O Padrinho”, filme de Francis Ford Coopola, de 1972, adaptado do livro com o mesmo título de Mário Puzo.
A minha preferência, tendo em consideração as opções qualitativas dos convidados anteriores, julgo que é sobre um grande filme.
O livro e o filme – quem em 1973 ganhou 3 Óscares, entre os quais o de Melhor Filme – apresentam-nos uma grande identidade e elementos múltiplos de relação entre as duas artes. No meu entender, neste caso, contribuíram para isso vários factores que se entrecruzaram, designadamente: o facto de Mário Puzo ter trabalhado com Coopola o guião/roteiro do filme a partir da sua recente obra literária, aliás um best-seller; a actualidade com que se apresentava, nessa época, a análise do tema Máfia, quer nos Estados Unidos, quer em Itália; as extraordinárias interpretações de vários actores, em particular, de Marlon Brando – que recebeu em 1973 o Óscar de Melhor Actor Principal – e, também, de Al Pacino; as capacidades de Coopola como realizador, ele que vinha positivamente espevitado pelo prémio que tinha ganho em 1970, com Patton.
Acho que estamos perante um muito bom filme que é preciso ver e desfrutar (pelo enredo, pelas interpretações, pela realização em vários campos), na certeza de que somos transportados para a análise de questões sociais, culturais e políticas de grande interesse. A leitura do livro, antes (ou depois) completa-nos a visão de todos esses campos.
As diversas cenas de violência, algumas bem duras, não se apresentam de forma indutora de outras violências. Elas partem do choque (a brutalidade) para nos deixarem a reflectir. O crime organizado é um estado dentro do Estado. Vêm ao de cima problemas complexos, como as infiltrações, influências e corrupção nas instituições e organizações da sociedade no plano social, económico e político, e, ainda, a instrumentalização, quer dos sistemas de justiça, quer de expressões dominantes da cultura.
Que interrogações se nos colocam, sempre, na reflexão a que somos conduzidos perante a figura de um “criminoso/estadista”?
Tomando os conteúdos do livro e do filme, somos projectados, por exemplo, para interessantes exercícios de análise e renovado confronto/articulação entre o individual e o colectivo. E, além de tudo, a reflexão sobre os valores e o jogo valores/sentimentos em torno da verdade, da mentira, da lealdade, da honra, ou da tão importante instituição família.
Duas últimas notas, em particular, para todos aqueles que queiram estar na Casa de Camilo, em Seide, no dia 31 de Outubro, às 21:30 horas: (i) tenhamos também presente que em 72/73 estávamos em período de “crise”; (ii) Camilo incorporou, na sua imensa obra, uma forte dimensão da crítica social (com certeza controversa) incluindo olhares sobre o exercício do poder, como em “A Queda de um Anjo”.
Até dia 31.
Manuel Carvalho da Silva

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Por quem os sinos dobram, de Sam Wood
Por Mário Zambujal

Não faltaram manifestações de discórdia quando o romance “Por quem os sinos dobram” conduziu Ernest Hemingway ao Prémio Nobel de Literatura, no ano de 1954. Igualmente o filme de Sam Wood, baseado no livro, foi alvo de críticas negativas. Pontos de vista. Tanto o livro como o filme resistem e continuarão a resistir à erosão do tempo.

No trabalho de Sam Wood avultam, não só os diálogos “bebidos” no livro, mas toda uma série de virtudes cinematográficas, desde a excelência da fotografia à banda sonora, passando pelo exemplar desempenho dos actores. Não apenas do duo protagonista – uma Ingrid Bergman lindíssima e um Gary Cooper a provar capacidades acima do herói de “westerns” – mas também do naipe de actores ditos secundários. Karina Paxinou, actriz grega que se estreava no cinema, teve uma actuação empolgante – que lhe valeu um “Oscar” – no papel de Pilar, a cigana que arrebata a chefia do grupo ao marido, Pablo, para se associar à aventura do jornalista revolucionário americano. A figura de Pablo permitiu a Akkin Tamiroff outra interpretação inesquecível. Ele é o chefe deposto por medos e calculismos e vive na dualidade entre a sua fama de bravura e a tentação da segurança para o seu grupo cigano.
Sem seguir todos os passos do livro – o que seria utópico dadas as diferenças de “tempos” entre as linguagens escrita e fílmica – Sam Wood explora com talento a história de amor entre Maria (Ingrid Bergman) e aquele a a quem chamam “o inglês” (Gary Cooper) num clima de guerra que surge em segundo plano mas que está sempre presente nas cavernas e montanhas que são o palco dominante do filme.
Mário Zambujal

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Ninetteen Eighty-Four (1984), de Michael Radford
Por Mário Dorminsky

“Aquele que controla o passado, controla o futuro. Aquele que controla o presente, controla o passado”. É com esta frase de George Orwell que começa um dos mais memoráveis filmes que passou pelo Fantasporto. A edição de 1985 do Festival Internacional de Cinema do Porto ficou marcada pela adaptação para cinema do livro “Mil Novecentos e Oitenta e Quatro” (“1984”) de George Orwell, pseudónimo de Eric Arthur Blair, feita por Michael Radford.
Nascido na Índia a 25 de Junho de 1903, Orwell foi para Inglaterra, ainda não tinha feito um ano. Com uma educação burguesa, cedo descobriu que queria ser escritor. Usou a sua arma favorita, a caneta, para denunciar um futuro demasiado realista.
“Mil Noventos e Oitenta e Quatro” foi escrito em 1948. Três anos antes tinha escrito outro fabuloso romance “O Triunfo dos Porcos”. Tal como “Mil Novecentos e Oitenta e quatro”, “O Triunfo dos Porcos” é uma metáfora sobre a sociedade moderna e a política.
Expressões como “Big Brother” são agora banais graças à utilização do termo como nome de um deplurável concurso televisivo. Aí é-nos prometida “a vida real como ela é”. No entanto, a essência do programa em questão, está na obra que Orwell escreveu, sendo a frase “Big Brother is Watching you” retirada da publicidade que inundou Londres aquando do lançamento do livro no final dos anos 40.

“Mil Novencentos e Oitenta e quatro” é a par de romances como “Laranja Mecânica”, ”Admirável Mundo Novo” ou “Fahrenheit 451”, um dos livros mais citados em todo o mundo.

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