O infortúnio e a tendência aventurosa de Camilo Castelo Branco são responsáveis pelos mitos que se desenvolveram à sua volta. O escritor é um dos principais responsáveis (senão o primeiro) por essa aura, não só perante o carácter heterogéneo da sua obra (desde o romance ao ensaio e às memórias), mas também pelo mistério que sempre alimentou sobre a sua própria vida, a começar nas origens, e a continuar no seu espírito aventuroso… Camilo Castelo Branco – Memórias Fotobiográficas (1825-1890) de José Viale Moutinho conduz-nos com mestria no percurso multifacetado de um nossos maiores escritores, mas, mais do que isso, leva-nos ao Portugal profundo do século XIX, que o autor de Amor de Perdição representa e descreve. Figura muitas vezes desconhecida, apesar do sucesso dos seus livros e da paixão que suscita ainda hoje em tantos leitores, Camilo protagonizou uma vida atribulada de romântico que teve a lucidez de se libertar dos constrangimentos de escola que esterilizaram outras promessas. Homem cultíssimo, estudioso exaustivo da história e da sociedade, romancista fecundo — Camilo soube ultrapassar as poderosas baias românticas, indo ao encontro das tendências modernas do seu tempo. A partir de uma personalidade muito forte, o retrato que encontramos de Camilo é a representação de alguém cujo talento resulta de um cadinho onde se misturam ingredientes quase explosivos da sociedade antiga e da sociedade contemporânea, que o escritor procura contraditoriamente compreender.
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Academia Politécnica do Porto
Posted in Lugares da vida e da ficção, tagged Academia Politécnica do Porto, Camilo, Camilo Castelo Branco, Casa de Camilo, Casa-Museu de Camilo, Cavar em ruínas, Nemine discrepante, Porto on Janeiro 2, 2010| Leave a Comment »
“Estudava eu Química na Academia do Porto.
De dois discípulos somente me recordo bem. Um era o melhor estudante; o outro, último da lista, seria o pior do curso, se eu lá não estivesse.
[…] Fugíamos da aula de cócoras, quando o sol de Deus nos estava incitando à rebelião. Com que tristeza eu via o sol e invejava a minha vida lá das serras donde viera estudar o sesquióxido de ferro e o bicarbonato de soda naquelas salas frias do convento da Graça.
[…] Soou a hora do acto. Já de antemão os condiscípulos me davam os pêsames: dizia-se que eu, além de ser um parvo quimicamente falando, tinha quarenta e oito faltas, afora vinte e duas abonadas, sete negas e cinco fugidas.
[…] Que acto eu fiz! Desenruguei a fronte do lente, enchi de júbilo os arguentes, espantei os condiscípulos e fui aprovado nemine discrepante” (*).
(In Cavar em ruínas)
(*) “Sem ninguém discrepar”. Nas academias, o estudante obtém aprovação plena, nemine discrepante, quando alcança a aprovação de todos os membros do júri; diz-se aprovado simpliciter, simplesmente, quando um dos membros deita um R, que os estudantes dizem ser a inicial de “Raposa”.
Camilo e a Cidade do Porto
Posted in Roteiro camiliano, tagged Abílio Alves, Academia Politécnica do Porto, Cadeia da Relação do Porto, Camilo, Camilo Castelo Branco, Casa de Camilo, Casa-Museu de Camilo, Convento de Monchique, Livraria Lello & Irmãos, Porto, Ribeira do Porto, Roteiro camiliano, Universidade Sénior de Famalicão on Março 25, 2009| Leave a Comment »
13 de Março de 2009 foi o dia escolhido pela Universidade Sénior de Famalicão para a realização de uma viagem de estudo ao Porto, a fim de aprofundar os seus conhecimentos sobre a vida e obra de Camilo Castelo Branco nessa cidade.
Camilo nasceu em Lisboa no dia 16/03/1825 e faleceu em S. Miguel de Seide em 01/06/1890, tendo deixado cerca de centena e meia de obras escritas, sendo que, muitas delas, se referem ao Porto.
Famalicão ainda mal tinha iniciado o seu labor diário – eram 08H50 – e a comitiva constituída por sete dezenas de alunos da nossa universidade, professores, funcionária e o Dr. José Manuel Oliveira, Técnico Superior do Centro de Estudos Camilianos de V. N. de Famalicão, partiam em busca dessa cultura.
Já muito perto das 10H00, o grupo dava entrada no antigo edifício da Cadeia e Tribunal da Relação do Porto onde Camilo Castelo Branco esteve preso.
Este edifício, hoje recuperado e alterado, funciona como museu e, portanto, já não é utilizado nas suas antigas funções de tribunal e cadeia. No entanto, mantém a sua traça e facilmente se nota, principalmente nas grades de ferro, a sua função de cadeia, com suas enxovias no primeiro piso, aposentos no segundo e celas individuais no terceiro.
Foi no terceiro piso que Camilo esteve preso numa cela que dava, nas traseiras, para a Igreja do Bonfim.
No segundo piso, visitámos a sala de audiências do Tribunal da Relação do Porto; enorme, de pé direito a rondar os dez metros, e sumptuosa.
Uma fotografia de todo o grupo à entrada do edifício encerrou a visita, sempre bem comentada pela Dr.ª Sónia, nossa guia no edifício e complementada pelo Dr. Oliveira em tudo que se referia ao escritor.
Daí fomos a pé, cerca de 300 metros, até à Livraria Lello & Irmão, onde chegamos por voltas das 11H45.
À entrada fomos recebidos e cumprimentados pela Senhora D. Fernanda Costa, Presidente da USF, acompanhada pelo marido, o senhor arquitecto Armindo Costa, Presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão, que nos acompanharam na visita breve a esta livraria, muito ligada a Camilo Castelo Branco.
Terminada a visita, o grupo dirigiu-se, nos dois autocarros que o trouxe de Famalicão, à Fundação de Serralves, onde, no seu restaurante, lhe foi servido o almoço que se prolongou até às 15H00 num convívio ameno e agradável.
Retomado o roteiro estabelecido percorremos, lentamente, toda a orla costeira desde o Castelo do Queijo até à ponte de D.Luís, que atravessamos para o margem esquerda do rio Douro, parando em frente às caves do Vinho do Porto da Sandeman.
Durante este trajecto o Dr. Oliveira foi explicando que Camilo também o percorria aquando da sua prisão por virtude de uma autorização especial que lhe havia sido concedida e, tudo indica, foi aqui, na Ribeira, que se inspirou para o final de seu “Amor de Perdição”, “pondo” a Teresa no convento de Monchique de onde tinha uma visão privilegiada da saída do barco que levaria o amado Simão para a Índia.
Mais uma foto do grupo, de costas para o Porto, e, às 17H00, iniciou-se o regresso à nossa cidade de Vila Nova de Famalicão onde, sem “azares” do dia treze, chegámos bem.
Abílio Ferreira Alves
Aluno da USF