«Era Camilo quem dizia haver três maneiras de se celebrizar: ou entrando no céu, ou na academia, ou na… cadeia.
No céu não entrou, com certeza, que ele não foi nenhum pobre de espírito.
A academia pertenceu – mas não nos consta que, alguma vez, lá tivesse posto os pés. Lá saberia porquê.
Na cadeia esteve – não uma, mas duas vezes.
Não ganhou celebridade pela banda do céu – por a porta lhe estar trancada.
Não ganhou celebridade por ser académico – porque a academia não dá celebridade a ninguém. A imortalidade que ela assegura morre no dia seguinte àquele em que o imortal desce à cova. A academia é como as estalagens espanholas do tempo da Maria Castanha: nestas o hóspede só encontrava o que levava consigo; naquela o académico só encontra a dose de imortalidade que leva consigo próprio.
Celebridade também não a ganhou por ter bisado a entrada na cadeia.
E, todavia, Camilo é célebre. Célebre – vamos dizer a coisa depressa – por ser picado do génio. As bexigas não contam.»
Cruz Malpique