Castelo Branco, Camilo – Poesia . Lisboa : Edição de Ernesto Rodrigues, 2008. 206 p.
Conclui Alexandre Cabral, no verbete “Poeta” do Dicionário de Camilo Castelo Branco (1989, p. 509), ser a «poética camiliana» a sua «área […] menos estudada». Entende por poética a reunião de poemas, cuja temática se diversificaria em «religiosa, lírica e até satírica» (p. 508). E percebe-se que, entre projectos falhados, reputação momentânea, polémicas e pseudónimos, a poesia foi, em Camilo, uma tempestade de Verão, ou funcionou por revoadas, pois, desde 1856, a novelística «obnubila os ambiciosos sonhos do poeta, assinalando a passagem da notoriedade à glória (MAS NÃO NA POESIA)» (p. 509).
Ora, não será possível integrar na poética geral de Camilo essa poética restritiva e mostrar a construção do verso camiliano como ficção acabada, enquanto invade a ficção propriamente dita e concorre para a definição de um modo de estar em literatura, seja do autor, seja de muitas personagens suas? Não será fácil demonstrar as potencialidades entrevistas logo na dupla estreia de 1845, fundamental na definição de lugares e figurações que revemos em acto ficcional? Será mero acaso o facto de abrir e fechar 45 anos de actividade literária pela poesia e, concretamente, pela soltura da tradição literária mais nobre (a épica, cedo passada a narrativa em prosa), invadida pela memória próxima e circunstâncias pessoais? Cremos que, olhando, por interposto verso, à personagem, às situações e às modalidades do sentimento, teremos uma visão global mais completa da produção camiliana.
Isso procuramos mostrar na introdução (p. 7-45), concluindo que, pela contaminação no vaivém de processos que deixam de ser qualidades de uma só espécie, deveríamos falar, não tanto de poesia e novelística, mas de ficção camiliana, de situações e personagens particulares, com tão vivo entranhamento pessoal.
A antologia reúne: 1841? – “Epitáfio”; 1845, 1889 – Os Pundonores Desagravados; O Juízo Final e o Sonho do Inferno; 1848 – A Murraça; 1854, 1858, 1865 – Duas Épocas na / da Vida (retocando Inspirações, 1851): 6 poemas; 1854 – Folhas Caídas, Apanhadas na Lama: 8; 1874 – Ao Anoitecer da Vida: 9; 1890 – Nas Trevas: 13; 1913 – Poesias Dispersas: 5.
Da colheita na ficção e miscelâneas, ainda considerámos “Dom Cupido Desdentado”, no capítulo VII d’ A Filha do Arcediago, e “A fidalguinha”, em Serões de São Miguel de Ceide; limitámo-nos, porém, ao soneto terminal de Coração, Cabeça e Estômago, que encerra lista de 46 poemas.
Ernesto Rodrigues