Largo do Carmo
«Da calçada do Carmo à rua da Oliveira é um tiro de pistola. À direita está a frontaria do templo de Nun`Alvares Pereira, escaveirado, corroído pelos vermes da civilização, com o seu pórtico de arabescos góticos, servindo de tenda de barbeiro. Em frente – donde os cavaleiros de D. João I vinham saudar o vulto venerado do condestável, que lhes acenava da fresta do claustro com a orla da túnica, como outrora, nos plainos de Aljubarrota, lhes acenara com a lâmina do montante – defronte, naquele terraço de veneração mística e saudosa, 50 galegos grunhem, reguingam e disputam a vez de encher o barril.
Aí estão duas épocas bem definidas. Na da civilização aparece o galego com a molécula constituinte da moderna sociedade portuguesa. À esquerda – à esquerda de quê? – à esquerda do largo do Carmo estão as guardas pretorianas, espécie de gaiola onde os cães de fila açaimados esperam que os açule um aventureiro político detrás do cofre da fazenda – É o quartel da guarda municipal. Segue-se a rua da Oliveira.»
Camilo Castelo Branco
(In O Nacional, de 15-1-1850)